AESE insight #115 - AESE Business School - Formação de Executivos

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Socorro, perdi o controlo. Será este o fim dos CMOs?

Mário Porfírio

Professor da AESE Business School

Os primeiros meses do ano foram marcados por várias notícias de eliminação dos cargos de CMO (Chief Marketing Officer) em algumas das 500 maiores empresas americanas (1,2) e logo a nuvem negra pairou no ar, “os cargos de CMO e o marketing, estão a perder a importância nas empresas”. UPS, Lowe’s, Hyatt Hotels, McDonald’s, Johnson & Johnson, Uber, Lyft, Starbucks, B InBev US, Etsy são alguns dos nomes referenciados, sendo que há decisões de divisão da responsabilidade por outros executivos, há decisões revertidas como o caso da McDonald’s e em termos globais são apresentados dados de um estudo que sugere que desde 2009 o cargo de CMO nas 500 maiores empresas americanas teria passado de uma representatividade de 74% para 71%, ou seja um quebra anual aproximada de uma empresa por ano.

A realidade de cada empresa é muito específica e não é o propósito deste artigo elaborar sobre a estratégia de cada uma, mas sim e por ser um tema de relevância para a área de marketing, aproveitar para olhar para a função de marketing e para o impacto que a transformação digital tem tido no que é esperado de um CMO no contexto atual, em particular na área onde a sua atuação tem mais visibilidade, a comunicação de marketing.

A comunicação integrada de marketing, surge nos anos 90 como uma reflexão académica de como os gestores de marketing estariam a planear, organizar, dirigir e controlar, todas iniciativas de comunicação de marketing de uma organização, que no fundo são as suas ações mais visíveis e de maior impacto. “One sight, one sound, one voice” (3) reflete a ideia de que uma mensagem consistente e única, difundida num conjunto crescente de canais selecionados para impactar os vários stakeholders da organização, permite atingir os resultados pretendidos (4) devendo este processo de gestão ser visto de forma integrada, sem silos.

A internet e sobretudo o telemóvel, alteraram o paradigma do consumo de mídia e como consequência a sua produção. Passámos de uma mensagem única e inalterável difundida em um ou mais meios, para uma multiplicidade de mensagens e pontos de contacto, aliada a uma busca constante de adaptação ao meio e aos destinatários que deu origem a outros novos canais, formatos, desafios, oportunidades e responsabilidades para as empresas. A fragmentação da atenção por vários canais, trouxe consigo uma perda de poder e autoridade dos meios, aliada a um aumento exponencial das comunicações e da sua complexidade ao passarem de unidirecionais para bidirecionais. Muitas empresas deixaram de ser apenas emissores, passando também a receptores e espectadores. A comunicação integrada de marketing passou então a ser vista como um processo de integração das interações de comunicação de dentro para fora da empresa (ex.: publicidade), com as interações de fora para dentro (ex.: respostas e comentários de clientes às comunicações das empresas) e com as interações entre consumidores, o passa palavra, (WOM – word of mouth simpaticamente chamado muitas vezes de “word of mouse”) nas redes sociais, e sites e fóruns de utilizadores.

Esta mudança de paradigma altera por completo as competências necessárias para um CMO a quem se passou a pedir que fosse um visionário de marca, um guru de marketing e do ciclo de vida dos produtos, um cientista de dados, o domínio de todas as tecnologias existentes relacionadas com a comunicação”(x) e outras tantas competências em simultâneo, que podemos afirmar, com alguma provocação à mistura, que o marketing é tanta coisa e é tão importante para as organizações que não está a perder terreno, mas pelo contrário está cada vez mais no centro das suas atividades e estratégias de tal forma que requere uma repartição por várias funções e pessoas, fruto da complexidade e heterogeneidade das competências. Ou como diria Peter Drucker ainda de forma mais provocadora “como o objetivo do negócio é criar um cliente, a empresa tem duas – e apenas duas – funções básicas: marketing e inovação. Marketing e inovação produzem resultados; todo o resto são custos.” (5)

Claro que é sempre mais fácil dizer do que fazer, e neste caso em concreto justificar os resultados. A tecnologia trouxe com ela a promessa, o sonho, da atribuição, a possibilidade de medir os resultados, das iniciativas de comunicação, o tão frequentemente mencionado ROI – Return on Investment, mas a realidade é que os CMOs têm dificuldade em calcular os resultados das suas ações e quanto maior o negócio e a organização pior. E nem precisa de ser uma empresa muito grande, só o facto de estar em vários canais em simultâneo, implica ter acesso a dados de diferentes fontes, colocando à prova a capacidade dos CMOs de gerir e integrar dados e ações de um número crescente de diferentes intermediários. Incluindo os que diariamente aparecem como especialistas que vão resolver de uma só vez, através de um caminho único todos os problemas e gerar de tal forma vendas e notoriedade de marca, que logo o meu pensamento voa para a frase de H. L. Mencken – “Para cada problema complexo há uma solução simples, que é clara, persuasiva e errada.” (6)

Há milhares de anos atrás passámos de caçadores coletores para agricultores e com isso o mundo prosperou. Este foi o ponto de partida dos CMOs, de uma revolução agrícola, seguida de uma revolução industrial, com uma procura incessante de previsibilidade, segurança e crescimento. Entretanto, com a incerteza passou a ser necessário, inovar, explorar e experimentar, por outras palavras, deixar a quinta ou a fábrica para ir à floresta caçar qualquer coisa ou apanhar umas bagas. Nesse caminho muitos descobrem que a integração da comunicação é feita não na empresa, mas na mente do consumidor e que cada consumidor valida as histórias que perceciona, com a realidade e as pessoas que o rodeiam. Que é uma ilusão acreditar que os marketters conseguem ter o controlo da comunicação de marketing. São sim um maestro que dirige uma orquestra de vários músicos e os únicos que sabem onde colocar os consumidores, na plateia a assistir, mas também no centro da orquestra para terem palco e brilhar. Algo me leva a crer que serão esses, que independentemente do nome/cargo, vão continuar a contribuir para o sucesso das empresas e organizações. O futuro o dirá.


Mário Porfírio
Founder and manager: inedito.com.pt; bar.com.pt; yteam.pt
1) https://finance.yahoo.com/news/fortune-500-companies-eliminating-chief-141721854.html
2) https://www.emarketer.com/content/starbucks-saying-goodbye-global-cmo-role-part-of-larger-trend
3) Schultz, Don E., Tannenbaum, Stanley I., e Lauterborn, Robert F. (1993). Integrated Marketing Communications: Pulling it Together and Making it Work.
4) Kliatchko, J. (2008). Revisiting the IMC construct: A revised definition and four pillars.https://doi.org/10.1080/02650487.2008.11073043
5) Peter F. Drucker, (1954). The Practice of Management
6) Henry Louis Mencken, (1920) Prejudices: Second Series by H. L. Mencken.

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