An article a day #45 - AESE Business School - Formação de Executivos

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An article a day #45

25 de maio 2020

Eurico Nobre

Professor de Política Comercial e Marketing na AESE Business School.

Os que sobrevivem, observou Darwin, não são os mais fortes mas sim os mais rápidos a adaptar-se. Essa é cada vez mais a natureza das empresas, num mundo em acelerada mudança, da qual a recente epidemia é apenas mais um episódio. Inesperado e disruptivo, sim, mas não mais que tantos outros cisnes negros, quando colocado na perspectiva que nos oferece o tempo. Destilado o essencial, sobressai uma ideia: o sucesso de uma organização não é um bem que lhe pertença, de forma permanente, é antes alugado. E a renda é devida todos os dias.

Make new friends, but keep the old. One is silver, the other is gold.


O mês de outubro de 2003 foi particularmente marcante. Não apenas iniciei o Executive MBA da AESE | IESE como também novas funções como Director de Marketing Estratégico na EMI. A indústria da música foi das primeiras a ser violentamente disrompida pela Internet, reduzindo-se a menos de metade em apenas uma década, comprimindo em média 8 a 10% anualmente. Nos Estados Unidos, o maior mercado mundial, as vendas passaram de 14,6 mil milhões de dólares em 1999, ano em que foi lançado o Napster, para 6,6 mil milhões em 2010[1].



Conservadora e acomodada, após demasiadas décadas de vendas e resultados crescentes sem o imperativo de inovar, tão pouco de se adaptar, a indústria, como um todo, respondeu de forma contundente, defendendo os seus direitos, legítimos, e o seu modelo de negócio, tradicional em toda a cadeia de valor, seja por via legal ou tecnológica, introduzindo, por exemplo, soluções de encriptação que impediam a cópia de CDs. Perante a nova realidade, olhou mas não viu.


Com mais de 60 milhões de utilizadores no seu momento mais alto, o Napster, como tantas outras plataformas semelhantes, ao facilitar a partilha ilegal de ficheiros online acabou por ter um papel decisivo na educação e na dinamização do consumo digital de música. Mais atento e observador da evolução destes novos hábitos foi Steve Jobs quem acabou por capitalizar a oportunidade para criar uma marketplace digital com o lançamento da loja iTunes, a 28 de abril de 2003. Desde logo, mudando as regras do jogo ao redefinir a política de preço, oferecendo a possibilidade de comprar uma canção por 99 cêntimos, em vez dos habituais 14 ou 15 dólares pagos por um CD. Hoje são plataformas de streaming como o Spotify que lideram a agenda, tendo entretanto tornado o iTunes obsoleto. De protagonista dominante, e apesar de ter voltado a crescer em vendas mais recentemente, a indústria viu-se, em definitivo, relegada para um papel secundário.


Neste momento de convulsão sem precedentes que impôs, da noite para o dia, mudanças profundas, importa parar para pensar. Por enorme que seja a pressão por sobreviver, em muitos casos, devastadora, hoje como nunca, e como sempre, é fundamental procurar a visão de helicóptero, separar o urgente do importante, o óbvio do acessório, encontrar resposta para uma questão fundamental: está a minha organização a fazer, ou a preparar-se para fazer, o que realmente importa para ser relevante amanhã? Por contraintuitivo que possa parecer, dada a pressão do rolo compressor quotidiano, a criação de valor, como o demonstra o artigo da McKinsey “NOW NEW NEXT: How growth champions create new value”[2], está intimamente ligada à visão de longo-prazo. E esta a uma sincera e desapaixonada avaliação da estratégia e competências da organização.


É certo que resultados imediatos atraem e motivam, mas pequenas vitórias hoje não significam necessariamente sucesso sustentando, sobretudo se desalinhados com aquela que é a proposta de valor. O Covid-19 não é um acelerador de transformações digitais, a mudança de hábitos sim. Um canal não é uma oportunidade. É apenas um canal. O facto de termos passados meses em casa e de termos encontrado online respostas às nossas necessidades quotidianas – com forte impacto negativo nas vendas no retalho tradicional – não significa que a oportunidade esteja no lançamento, em ritmo acelerado, de uma solução de e-commerce, ou similar. Não é por abrir uma garrafeira digital que um produtor de vinho vai passar a conquistar novos clientes, se não estiver preparado para os atrair e servir. Não é por aderir a uma plataforma de take-away que um restaurante vai passar a vender no Uber Eats ou Glove, entre centenas de tantos outros, se sua ementa ou marca não estiverem já na lista de preferências.


Haverá, sem dúvida, oportunidades a explorar em novos segmentos ou para experimentar novos modelos de negócio, mas o essencial mantém-se: determinar, e ter claro, quais são as coisas que a organização faz bem, que são importantes e valorizadas pelos seus clientes mas ignoradas pelos seus concorrentes. Ou seja, produtos ou serviços que permitam ter uma proposta de valor distinta e relevante. Definir através de que canais os disponibilizar para garantir a maior rapidez e conveniência. Mais importante: garantir a entrega da experiência, assente numa cultura forte, competências, soluções tecnológicas e processos adequados.


O complicado é descomplicar mas a fórmula é simples: as empresas mais bem sucedidas são aquelas que conseguem manter clientes por mais tempo de forma rentável. Este é o momento para cuidar dos seus. E das suas pessoas, que deles cuidam.


[1] https://www.visualcapitalist.com/music-industry-sales/


[2] https://www.mckinsey.com/business-functions/marketing-and-sales/our-insights/now-new-next-how-growth-champions-create-new-value

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